Congregação dos Sagrados Estigmas De nosso senhor Jesus CristoPresente no Brasil desde 1910
Província Sta. Cruz

Festa de São Gaspar Bertoni

Mensagem do Superior Geral para a Festa de São Gaspar Bertoni

Roma, 06 de junho de 2018.

Caríssimos Confrades,

 

Aproximando-nos da Solenidade de São Gaspar Bertoni, a ser celebrada no dia 12 de junho, quero me dirigir a cada um de vocês e, de maneira muito afetuosa e especial, àqueles que passam por algum momento difícil ou particular em suas vidas, convidando-os a comemorar com o coração agradecido esse grande dom de Deus à humanidade e à Igreja, que é São Gaspar Bertoni.

Certamente, cada um dos filhos espirituais de Pe. Gaspar consegue perceber um ângulo ou aspecto de sua vida e do seu testemunho, que sempre merece ser retomado e aprofundado, para ser apropriado e manifestado à humanidade, e acima de tudo, pelo empenho de nossos confrades, e, como consequência pelo seu testemunho.

 

  1. São Gaspar Bertoni, o homem eclesial

Pe. Gaspar, ainda jovem sacerdote, viu nas palavras de seu pároco, Pe. Girardi, um convite para socorrer a infância e a juventude de seu tempo, tão contaminadas e prejudicadas pelos ensinamentos nefastos oriundos da Revolução Francesa e que maculavam e destruíam a família, favorecendo o surgimento de grupos de marginalizados, esquecidos e desprotegidos pela sociedade daquela época. Diante desse chamado, que se revelou desafiador e exigente, Pe. Gaspar se esmerou, oferecendo o melhor de si, para, através das Coortes Marianas, auxiliar, de maneira criativa e inteligente, àqueles que perambulavam pelas praças e ruas, sem ter quem lhes desse atenção e os ajudasse em sua formação, humana e cristã.

No desejo e na vontade dos bispos, que se sucediam no governo da Diocese de Verona, Pe. Gaspar viu manifestada a vontade do próprio Deus e, assim, se desdobrou no atendimento à juventude, ao clero, à pregação de retiros, à direção espiritual de diversos fundadores, especialmente da Beata Leopoldina Naudet, à visita aos encarcerados e enfermos, à pregação de Missões Populares, ao atendimento de confissões, etc.

Por sua vez, os bispos de Verona sempre viram em Pe. Gaspar o homem da prudência, fidelidade doutrinária e eclesial, discernimento, sabedoria, firmeza, coerência de vida, generosidade e desprendimento. A cidade e a diocese de Verona foram enriquecidas e muito usufruíram pela presença e atuação de Pe. Gaspar, que marcou, de maneira indelével, a história. Suas realizações são reconhecidas e recordadas com apreço pela sua cidade natal e continuam a inspirar àqueles que herdaram sua espiritualidade e seu carisma, especialmente a família de Vida Consagrada por ele fundada.

Portanto, afirmar que São Gaspar Bertoni foi profundamente um homem eclesial é reconhecer sua contínua e revigorante comunhão com Deus, seu testemunho de vida, sua sensibilidade diante do momento histórico em que viveu e, também, seu empenho e sua dedicação à Igreja, revelados nos inúmeros trabalhos abraçados por ele. Para nós será sempre um exemplo a ser seguido e um estímulo que nos ajudará na condução de nossa Consagração; como ainda no assumir cotidiano de nosso carisma.

 

  1. São Gaspar Bertoni, o homem do saber e da cultura

 

Ainda adolescente, Gaspar Bertoni, já demonstrava o quanto era dotado de inteligência e o quanto almejava o conhecimento, o saber e a cultura. O estudo e as leituras exigiam longas horas de dedicação e aprimorada apreço, visando aperfeiçoar seu conhecimento e sua cultura. No decorrer da sua vida, Pe. Gaspar, que buscou incessantemente o saber e o aperfeiçoamento intelectual e cultural, favoreceu com esse seu interesse, que surgisse ao seu redor um aglomerado de pessoas que, orientadas por ele, procuravam conhecer as publicações mais recentes, que abordavam temas referentes às diversas áreas do saber e que ajudavam na solidificação dos conhecimentos filo-teológicos.

A vaidade, a presunção e a arrogância nunca encontraram espaço nessa incessante busca feita pelo Pe. Gaspar e seus companheiros, pois o que os movia e os estimulava era o desejo de conhecer mais, para melhor servir. Assim em tudo buscavam apenas a glória de Deus. Daí que, para a maior glória de Deus (Ad maiorem Dei gloriam) é necessário saber e compreender mais e melhor, ampliar a cultura e o conhecimento, dedicar-se com esmerado denodo ao estudo e à pesquisa, não se acomodar diante de realidades e conhecimentos que evoluem e mudam quase que diariamente, exigindo um contínuo e intenso esforço para sempre se manter atualizados.

A biblioteca dos “Estigmas” revela e confirma essa dimensão da vida de nosso Fundador, que sempre dedicou tempo e recursos para aperfeiçoar seus conhecimentos e favorecer àqueles que, estando ao seu redor, usufruiriam dos benefícios de sua orientação e da oportunidade de pesquisar livros e periódicos adquiridos pelo Pe. Gaspar.

A celebração da solenidade de nosso Fundador é uma motivação e um estímulo, para que todos nós façamos uma avaliação a respeito do tempo que temos dedicado às boas leituras e ao estudo, além disso e, espelhando-se em seu exemplo, procurar se educar melhor no aproveitamento do tempo, na organização de nossas tarefas, na busca e na assimilação do saber, do conhecimento e da cultura, podendo, assim, servir melhor a Deus e aos irmãos.

 

  1. São Gaspar Bertoni, o Missionário Apostólico

 

Numa sociedade que contava com um grande número de clérigos, como aquela em que Pe. Gaspar viveu, alguns chegam a pensar que seria desnecessária uma atividade apostólica intensa, como aquela desenvolvida pelo nosso Fundador. No entanto, é preciso ressaltar que a sociedade como um todo encontrava-se enferma, solapada por práticas e costumes contrários à fé e à retidão de vida. Corroída por essas práticas nefastas, presentes inclusive no meio do clero, Verona necessitava, urgentemente, de “um novo encontro com o seu Amor Primeiro”, por meio da pregação das Missões Populares, como também para a orientação e atendimento aos eclesiásticos. Pe. Gaspar, que se destacou zelosamente em suas atividades, foi o grande apóstolo dessa cidade, colocando-se inteiramente ao lado do bispo, para ajuda-lo naquilo que ele mais estivesse precisando. Por isso, passava do seminário ao púlpito; do confessionário às visitas aos enfermos e encarcerados; da pregação de retiros à orientação de sua nascente Congregação; das lidas e afazeres ao recolhimento e à oração, permanecendo assim por longas horas na presença do Senhor, que o sustentava, o fortalecia e o confirmava na missão de anunciar o Evangelho.

Os relatos a respeito do incansável missionário, que foi Pe. Gaspar, são abundantes e nossos primeiros confrades, inspirando-se neles, assumiram, de maneira alegre e generosa, o legado de nosso Pai Fundador, “que quis se fazer próximo de todos, a fim de ganhar o maior número para Cristo” (cf. CF nº 272).

Nós, estigmatinos, presentes numa grande e variada realidade social e geográfica, devemos espargir, com o testemunho e a pregação, o “bom perfume de Cristo”, tornando-nos Monges e Apóstolos na própria comunidade, como naquelas outras atividades que cada um de nós assume como apostolado. Missionários incansáveis que, a exemplo de Pe. Gaspar, estando nos grandes centros urbanos, ou nas periferias das grandes cidades, ou nas realidades mais longínquas e rurais, “levam o fogo do Evangelho” (cf. Lc 12, 49); para renovar e transformar estruturas, vidas, conceitos, mentalidades. Somos os missionários de Pe. Gaspar! Somos Missionários Estigmatinos.

 

  1. São Gaspar Bertoni, o Fundador de uma família de Vida Consagrada

 

A experiência diante do altar de Santo Inácio de Loiola, que fez Pe. Gaspar ouvir o convite desse santo fundador dos Jesuítas, para iniciar uma Congregação, revela o quanto nosso santo Fundador já havia amadurecido e alcançado o grau mais elevado da teologia mística. Os tempos eram contrários e o momento não era oportuno para se iniciar uma nova Congregação. No entanto, Pe. Gaspar começa com um pequeno grupo essa nova família, e gota a gota, vai escrevendo suas Constituições (cf. Carta ao Pe. Bragato, nº 9). Não desanima. Não se abate quando tudo parecia ser desfavorável. A obra não era sua e ele mesmo nem considerava como Fundador. A obra era de Deus e a inspiração, que havia vindo dessa experiência mística, é que o motivava a continuar, apesar das incompreensões, enfermidades, desistências dentro do já tão reduzido grupo, mentiras e calúnias que alguns levantaram contra eles. Pe. Gaspar segue adiante... A obra é de Deus!

Recentemente, celebramos os 200 anos dessa Congregação, que teve seu início no dia 04 de novembro de 1816, em Verona, na Itália. Todos os missionários estigmatinos do passado deixaram um legado de desprendimento e audaciosa coragem, revelados e manifestados na disponibilidade às solicitudes dos superiores e no gesto de enfrentar tantas adversidades e problemas, sem, no entanto, nunca desistir, entibiar ou esmoecer: perseguições, doenças, desconhecimento da língua, fome, frio, incompreensão... nada disso nunca foi empecilho para eles frente à “mobilidade para ir a qualquer lugar, na Diocese e no mundo, livres de dignidades, moradias fixas, benefícios e da orientação perpétua e particular de almas” (CF, nn. 4-5).

Na celebração, que nos recorda a exemplar fidelidade de São Gaspar Bertoni e a fecundidade de uma vida consumida em prol de um projeto que se revelou grandioso e com reflexos benéficos na história da humanidade, cada estigmatino deve renovar:

- fidelidade à nossa Congregação estigmatina e à sacerdotal e apropriando-se da graça oferecida pelo Senhor, para bem viver essa vocação.

- fidelidade em vivenciar “um estilo de vida conforme o uso de eclesiásticos perfeitos, entre os quais vive, e que sirva de edificação para os fiéis pela sobriedade cristã e pobreza evangélica” (cf. CF n.6).

- fidelidade e esforço hercúleo “para ser um só coração e uma só alma, na concórdia e na união reciproca das vontades” (cf. CF n. 189), a exemplo dos primeiros cristãos e dos Apóstolos;

- fecundidade em viver “os valores permanentes da espiritualidade: exercício ascético das virtudes, mortificação, observância das Regras, cultivo do recolhimento e do silêncio, bom uso do tempo” (cf. C. n 41; CF nn 47-48);

- fecundidade em renovar o esforço diuturno e incansável de não se deixar levar pelas fofocas, maledicências, sentimentos ruins e negativos a respeito dos confrades (cf. CF n 194);

- fecundidade em “oferecer a melhor assistência aos anciãos e enfermos, servindo a eles como a Cristo” (cf. CF n 236).

Para tanto contamos com a graça de Deus que vai fortalecendo nossos bons propósitos contamos também com a Sua ajuda e contínua intercessão de nosso Santo Fundador, São Gaspar Bertoni, para sempre sermos um corpo coeso e saudável, todo ele motivado a fortalecer e a revigorar a nossa Congregação Estigmatina.

 

  1. São Gaspar Bertoni, o homem de Deus

Ao deixar por último esse aspecto, não o vejo em menor grau de importância, mas o apresento como aquela realidade que sempre nutriu e deu sentido à vida de Pe. Gaspar. Ainda criança, em suas penitencias corporais e desenhos feitos à margem de seus cadernos escolares, já revelava comunhão amorosa e reverencial presença na relação da criatura com o seu Criador; a relação de uma alma pueril e inocente de um infante e a grandiosidade e magnitude dAquele que é amado e desejado como “doce hospede da alma” e a Quem nunca nessa vida se conseguirá possuir em plenitude, ainda que O busque diligentemente.

No reconhecimento da pequenez e da fragilidade da criatura é que faz surgir essa dependência amorosa por parte de Pe. Gaspar em relação a Deus. Ele O procurou incessantemente e com Ele se entretém, saboreando a fecundidade dessa comunhão, tão bem expressa em seu “Memorial Privado” (cf. MP 11-12-1808).

O itinerário espiritual, percorrido pelo Pe. Gaspar, desde sua infância até sua maturidade humano-afetiva e psicológica, revela o encantamento crescente de um homem que se deixa moldar pelo Senhor e que, por meio da escuta da Palavra, das horas inúmeras passadas diante do Santíssimo Sacramento, se aperfeiçoa e cresce na experiência de um relacionamento esponsal da criatura com o seu Criador. E, na medida em que o tempo passa, Pe. Gaspar compreende a necessidade e a importância de não viver só para si, mas para Deus e para os irmãos, por meio da oração e do apostolado. Na oração, ele é abastecido por Deus e no apostolado ele se consome por amor a Deus, no intuito de que muitos também amem e sirvam a Deus Nosso Senhor.

Com o passar dos anos, Pe. Gaspar, já impossibilitado de locomover-se, fragilizado pelas enfermidades e sentindo a proximidade do final de sua vida, continua firme em seus propósitos e nos dá a grande lição de que, mesmo tendo que se consumar ao extremo pela dor e pelo sofrimento, ele nunca se desespera e não abandona sua confiança em Deus. Frequenta com docilidade a escola do sofrimento e nela aprende, com o Servo Sofredor, o significado da renúncia, obediência, e confiança em Deus, o único Senhor da sua vida.

No dia 12 de junho de 1853, Pe. Gaspar Luis Dionísio Bertoni, morre em Verona e, pelo seu testemunho de vida e por sua confiança inabalável na Divina Providência, recebe a coroa imperecível e a recompensa reservada por Deus aos seus Santos. A cidade de Verona acorre à igreja dos “Estigmas” e a multidão ali presente afirma que havia morrido um homem que tinha vivido somente para Deus. No dia 01 de novembro de 1989 a Igreja, na pessoa do Papa João Paolo II, anuncia ao mundo que aquele sacerdote, que havia morrido em Verona, com grandíssima fama de santidade, de fato merece as honras dos altares e sua vida e seus exemplos servem de estímulo para todos.

Portanto, como membros que somos da Congregação Estigmatina fundada por São Gaspar Bertoni, celebrando hoje sua solenidade litúrgica, sejamos todos envolvidos pela graça de um novo encantamento, renovados e curados todos daquelas feridas que outrora nos fizeram distanciar dos confrades, fechando-nos em nós mesmos, e nos fizeram perder a vitalidade em nossa atividade apostólica, como também o abandono daquelas práticas de piedade e de valores da vida comunitária, que são tão importantes para nossa Vida Consagrada.

 

CONCLUSÃO

A solenidade, que hoje celebramos, não é apenas uma data marcada no calendário, mas é, acima de tudo, o reconhecimento e a gratidão a Deus Nosso Senhor, por tudo aquilo que realizou Pe. Gaspar no decorrer de sua vida, pela sua continuidade na história, pela presença, atuação e testemunho de nossa família estigmatina.

Que esta celebração da Solenidade de São Gaspar Bertoni nos leve a assumir compromisso de:

- deixar-nos cativar e reencantar por Jesus Cristo e, permanentemente, com renovado ardor, anunciá-lO aos nossos irmãos, especialmente àqueles que se encontram nas periferias geográficas e existenciais;

- amar a Igreja, servindo-a em cada Diocese onde estamos presentes, renovando nossos empenho de sempre permanecer “in obsequium episcoporum”: “A serviço dos Bispos”.

- cuidar, com zelo e esmerada atenção, de nossa comunidade estigmatina, nossa espiritualidade; nossa vivência dos Conselhos Evangélicos; nossas práticas de piedade; nosso Capítulo mensal da Comunidade; nossa formação humana, afetiva, espiritual...

- preocupar-se com nossa continuidade, por meio de atividades e práticas que favoreçam o cultivo e o aumento das vocações à Vida Consagrada Estigmatina e à sacerdotal;

- qualificar nossa ação apostólica, dando um destaque especial àqueles ministérios que fazem parte de nossa tradição: pregação, atendimento aos eclesiásticos, educação cristã da juventude. (Cf. Const. Atual n 2)

Finalizando, desejamos que Deus seja sempre louvado por nós estigmatinos e que nosso Pai Fundador, São Gaspar Bertoni, receba nossa prece de gratidão pela sua vida, pelo seu testemunho e pela nossa Congregação. Ao mesmo tempo, pedimos ao nosso Fundador e à mediação sempre constante e amorosa de nossos Santos Patronos, Maria Santíssima e São José, que apresentem a Deus nossas prementes necessidades pessoais e comunitárias, alcançando-nos, também, as graças de que estamos precisando, para nossas Províncias e Delegações, como também para toda a nossa Congregação.

Com afeto e estima, abraço-os em Cristo, desejando-lhes uma solenidade vibrante em honra de São Gaspar Bertoni.

 

Pe. Rubens Sodré Miranda, CSS

Superior Geral